Pelo menos 16,7 mil aposentados do INSS temem terem sido lesados em MS
Imbróglio ganhou repercussão em maio deste ano e 9 milhões de segurados pela Previdência já foram notificados via aplicativo
| CORREIO DO ESTADO / ALISON SILVA
Pelo menos 16,7 mil aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) já procuraram ajuda para saber se foram lesados por descontos indevidos em seus benefícios e para recorrer da situação em Mato Grosso do Sul. O atendimento é feito por agências dos Correios em vários municípios do Estado.
Em todo o Brasil, segundo estimativas do governo federal, os descontos podem chegar a R$ 4 bilhões, em mensalidades associativas não autorizadas ou outros descontos. Em todo o País, 1.159.362 pessoas já buscaram ajuda.
O trâmite segue até 31 de dezembro deste ano e pode ser acompanhado pelo aplicativo Meu INSS, pelo telefone 135 ou em uma das 85 agências dos Correios espalhadas pelo Estado, visto que plataformas digitais e aplicativos podem ser de difícil acesso a idosos que aguardam reembolso, imbróglio que ganhou repercussão em maio.
O governo federal, pelo aplicativo Meu INSS, notificou 9 milhões de segurados sobre os descontos. Aposentado por invalidez em virtude de problemas cardíacos, o ex-vigilante Moises Teixeira Borges, de 60 anos, identificou dois descontos não autorizados em sua aposentadoria de R$ 1,8 mil mensais.
O fato curioso é que ele disse ter sido procurado por meio de uma falsa advogada.
“Eu fui avisado por uma tal advogada, pessoa que eu não conhecia e me ligou avisando que havia descontos na minha conta do INSS. Não sei como ela me achou. Esperei contato, ela não me ajudou com o recurso e eu fui atrás dos meus direitos”, disse.
Questionado, disse não saber a exata quantia descontada atualmente de sua conta, contudo, afirmou que um dos descontos é feito por um sindicato, no valor de R$ 50 mensais. Destacou que, apesar de utilizar o aplicativo, prefere ser atendido pessoalmente.
“Conheço o aplicativo, mas eu prefiro vir pessoalmente, procurei contato por meio do 135, resolver pessoalmente é bem melhor do que por telefone”, finalizou.
Ex-professora, Maria Beatriz Oliveira, de 62 anos, afirmou que ficou bastante “impactada” quando soube dos descontos indevidos em sua aposentadoria.
“Vim buscar os meus direitos porque a gente já ganha pouco e ainda tiram o pouco que nós temos. Eu acho tranquilo usar o aplicativo, mas perdi minha senha e, por questões de segurança, achei melhor vir até uma agência dos Correios. Havia vários descontos, não sei dizer ao certo quantos, mas eram muitos”, frisou.
AJUDA
Especialista em Direito Previdenciário e colunista do Correio do Estado, a advogada Juliane Penteado destacou que aqueles que se sentirem lesados pela demora no ressarcimento das mensalidades associativas do INSS podem buscar advogados ou a Defensoria Pública.
Segundo a advogada previdenciária, a medida pode ter o reconhecimento ou o peso de uma liminar.
“Suspende imediatamente qualquer desconto que porventura não tenha sido suspenso, aí o trâmite do processo se dá em um prazo que varia de acordo com a localidade, com a região, a quantidade de juízes que tem na cidade ou na Vara”, explicou.
Em alguns casos, a advogada destacou que os valores podem ser devolvidos duplamente, caso o idoso lesado comprove dano moral por parte da Previdência. Quanto à dinâmica remota de atendimento, Juliane acredita ser uma questão de trabalho.
“De fato, a dificuldade dos idosos para lidar com esses aplicativos também tende a ser um agravante, mas, a partir do momento que houver um profissional dando essa sequência, isso pode ser resolvido de forma direta”, disse Juliane, que, diante do cenário de demora nos pagamentos, recomendou cautela por parte dos lesados.
“Nesse momento, as pessoas vão ter de analisar caso a caso. Às vezes, o valor para a pessoa que foi lesada de fato é um prejuízo, a gente pede que a pessoa avalie sobre a espera do governo ou busque orientação de um advogado”, finalizou.
Advogada, Ariane Lemes Matoso é quem lida com os processos da mãe, a aposentada Elizabethe Gutierrez, de 85 anos.
“Minha mãe teve esses descontos, que eu percebi ano passado. Tive que entrar em contato com a empresa que estava realizando os descontos, formalizar o pedido no site do INSS e solicitar a restituição”, destacou.
Segundo Ariane, o instituto sempre alega falta de documentos e assinaturas.
“Tem que ter paciência, o INSS já é ruim por si só e faz isso de propósito. Na hora de descontar não é burocrático, mas, para cancelar, sim. Os idosos não têm alguém que faça para eles e vão sofrer mesmo”, falou.
As investigações partiram da Controladoria-Geral da União (CGU), em conjunto com a Polícia Federal, por meio de operação contra um esquema nacional de descontos associativos não autorizados em aposentadorias e pensões do INSS.
Ação realizada em 34 cidades do País, em março deste ano, por meio da Operação Sem Desconto, cumpriu 211 mandados de busca e apreensão e outros 6 de prisão temporária em 13 estados e no Distrito Federal.
PANORAMA
No início deste mês, um levantamento da procuradora-chefe da Coordenadoria Jurídica do Procon de Mato Grosso do Sul (Procon-MS), Carla Cardoso Nunes da Cunha, mostrou que o volume de descontos indevidos pode ser muito maior que o identificado até agora pela Operação Sem Desconto, como mostrou o Correio do Estado.
Ao menos 121 entidades associativas ou empresas têm feito descontos indevidos nos benefícios de aposentados e pensionistas. Desse total, 11 já são alvo da Polícia Federal.
As 121 entidades suspeitas de fazer descontos indevidos identificadas pelo Procon-MS também representam um número 11 vezes maior que o revelado até agora pela Polícia Federal.
A procuradora do Estado também observou que o INSS, em seu site oficial, lista apenas 29 entidades com as quais teria acordos em vigor.
ENTENDA
A investigação aponta que entidades como sindicatos e associações realizaram descontos associativos sem autorização dos beneficiários, por meio de acordos de cooperação técnica com o INSS. Estima-se que cerca de 4,1 milhões de pessoas tenham sido afetadas, com um prejuízo total de aproximadamente R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024.
Em resposta às denúncias, o Congresso Nacional aprovou a criação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para apurar as irregularidades no INSS, pedido que foi apresentado no mês passado, com apoio de parlamentares da oposição e de alguns membros da base governista.
A operação resultou no bloqueio de aproximadamente R$ 1 bilhão em recursos das entidades investigadas, montante que está sendo utilizados para o ressarcimento dos prejudicados.
A Advocacia-Geral da União (AGU) também solicitou o bloqueio de mais de R$ 2,5 bilhões, aguardando decisão judicial.
SAIBA
Nas agências dos Correios habilitadas, os aposentados e pensionistas do INSS podem consultar e contestar descontos e reconhecer a autorização de alguma retirada financeira. Todo o atendimento é gratuito nas agências, com sistema de gestão de filas ou guichês exclusivos.